Ao longo desse tempo eu vinha vivendo na minha zona de conforto achando que entre nós havia uma translúcida penumbra que nos fazia coexistir de forma agradável. Mas eu estava enganada. Tola e vã dei o melhor de mim, fiz o inimaginável para agradar e achei que estava executando bem o meu papel quando na verdade mal consegui alcançar meu objetivo. 
As suas palavras me mostraram um lado em que eu fiquei assustada em conhecer, me senti com medo e insegura por não perceber isso antes. Mas agora é tarde pra tentar consertar tudo e bem que eu queria voltar no tempo e aproveitar aquele seu outro lado que não me magoava, que me amava e não me deixava infeliz com umas palavras soltas e afiadas.
Me lamentar não vai mudar o jeito de como as coisas aconteceram então o melhor é me levantar, tomar um banho e comer algo, pois desde ontem não ponho nada no estômago. 
Já fechei os olhos bem forte na esperança de tudo passar como uma nuvem negra mas não funcionou e não tenho mais forças pra embarcar numa aventura patética. Eu não sei por onde você esteve ou em quais terras pisou pra ficar desse jeito, só sei que não te reconheço. E queria muito estar errada, mas você mesmo disse que não iria retornar ao passado. E eu sinto muito por você, por mim e por nós. Era uma linda e grandiosa história que agora servirá de inspiração para uma poesia ou para uma carta numa garrafa lançada em alto mar. Recolho meus pedacinhos de sua vida e saio, não só pelo fato de ter cuspido isso em meu rosto, mas pelo ar que me falta pra prosseguir. Preciso descansar, pois meus músculos doem de tanto se contrair por sua causa e não quero carregar isso comigo. 
Deixarei a cidade hoje e pretendo não cruzar mais seu caminho enquanto for viva para que não me aflija o mal da saudade, para que não me sobrevenha o buraco no peito que dói. E espero que fique bem e que se recupere, não vou desejar-lhe mal, pois não provém de meu feitio. Só desejo que as malditas lembranças que rodopiam em minha cabeça se apaguem como se eu nunca tivesse vivido esse dia.